quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Carta ao Menino Jesus



Meu menino jesus, falo muito pouco contigo, talvez esteja em falta, guardo há muito todas as nossas conversas para mais tarde, quando os anos pesarem e na falta de amigos aí sim, falarei contigo, prometo que porei todas as conversas adiadas em dia, não sei que pensas disto, podes achar sacrilégio eu guardar as conversas para os momentos de solidão que a vida certamente me trará. Porém hoje dedico algum do meu tempo apressado a uma conversa adiada.
Sabes, por um momento imaginei-me novamente criança, e se o fosse pediria uma cesta cheia de chocolates como prenda de Natal, quando era menina adorava chocolates, corria na manhã do dia 25 para a meia pendurada na chaminé, onde o grande madeiro de Natal crepitava e as largas chamas se assemelhavam a dragões, tinha ardido a noite toda e mesmo assim o grande tronco de azinho ainda ia a meio, e lá estavam eles, os chocolates dentro da meia, um pai natal pequenino e dois ou três bombons, o melhor presente que me poderiam dar.
Imagino que aches estranho se eu te pedir chocolates este ano, mas é isso mesmo que te peço, chocolates em forma de vontade, a vontade que os senhores do mundo tem negado a todas as crianças que nesta quadra vão passar frio e fome, sabes escrevo e penso muito ao longo do ano em todas as crianças com fome, talvez porque mesmo crescendo sem pai, nunca passei fome, nunca soube o que era frio no Inverno, nunca tive a barriga colada às costas, mas imagino se a sorte me tivesse sido ainda mais madrasta, a sensação dos pés descalços na lama nas manhãs frias de Inverno, ou o olhar aguado frente à porta da padaria, onde todas as manhãs em dias de escola podia ir buscar um bolo, que a minha tia mais tarde pagaria.
Pois bem é chocolates que te peço, chocolates em forma de bom senso, que todos os senhores do mundo parem no dia de Natal e repensem as politicas porque se regem, sei que é utopia mas peço-te pais natais aos montes, que todos os pais que por este ou aquele motivo deixaram filhos para trás no percurso da vida, repensem esse mesmo percurso, também quero um saco enorme de moedas de chocolate, se não for pedir muito quero que as convertas em abrigos para quem deles necessita, não te vou pedir pelo meu país, não, peço pelo mundo que na sua vastidão tanto abandono acarreta, e agora como a noite vai alta e tu tens mais em que pensar, para mim peço que nunca me cortes a imaginação e que me continues a dar destreza para repassar para o papel as minhas conversas, mas não te zangues por eu raramente falar contigo, e que no ano que vem a minha carta de natal transcreva felicidade, era sinal que atendias a pelo menos metade dos meus pedidos, mas se por ventura os homens continuarem cegos e tu não lhes consigas tocar o coração, por favor Menino Jesus, que no próximo Natal as crianças adormeçam a meio do dia, se dormirem a fome ficará mais leve.

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