Sabes que mais, hoje estou marafada como dizem no Algarve, marafada e com a pulga atrás da orelha.
Está bem, já sei que quando começo com estas conversas vem ardil, e que o tempo se torna curto para as explicações exigidas, mas olha hoje não são necessárias explicações, a minha pulga diz-me que te amo, que gosto dessas rugas e desses cabelos despenteados, que gosto do ar inquisidor - Afinal que queres dizer com isso - sempre o mesmo ar para fingir que não entendes. Há coisas que quanto maior for a explicação maior o nó na moleirinha. Sabias, já dizia a minha avó, claro está-se mesmo a ver a minha avó sabia lá do que falava, e a tua, eram as duas quase da mesma idade, uma tinha a cartola a outra a sebenta. Sim sebenta, essa agora. Diz que não sabe o que é uma sebenta, claro que não é alguém com falta de banho, isso é outra coisa. Sebenta é aquele caderninho preto que servia para tudo, desde as receitas de culinária até ao raspanete a dar no avô. Coitado do avô não tinha culpa se ressonava a noite toda, naquele tempo ainda não havia pensos para o nariz, assim como usam agora os jogadores de futebol, gosto mesmo de os ver com aqueles pensos, um de cada cor.
Que foi agora, ah estás perdido na conversa, pronto eu confesso, estamos quase a fazer anos e eu, eu, amo-te de igual modo, parece que os anos não passam, tirando a pulga atrás da orelha que me vai lembrando estas coisas, está tudo igual.
Agora vou fazer o jantar, hoje para variar escrevi-te durante a tarde.
Mas olha, faz favor de não te esqueceres da prenda, como fizeste no ano passado, estás a ouvir!
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