sábado, 27 de agosto de 2011

A tarde


Hoje não te escrevo no silêncio da madrugada, escrevo-te por entre o barulho da claridade. Ainda há pouco a tarde me perguntou pela tua ausência, fiquei muda perante a incapacidade de uma resposta plausível. Como podemos responder ao desconhecido sobre uma interrogação que nos atormenta o ser, que poderia eu ter dito à tarde, quando muito podia enumerar mil motivos esfarrapados, com os quais nas noites de insónia me tento acalmar, mas como defender o entendível perante a luminosidade da tarde.  
Perguntou-me ela pelo som dos teus passos cautelosos, pela tua sombra na parede branca, pelo som da tua voz no corredor da imaginação. Eu ali estava muda olhando-a nos olhos com receio dos seus pensares, não por mim mas por ti, que escorregadio és nas permanências, que insidioso nas faltas. 
Meu amor, eu sei que sabes, que tenho razão, e que a tarde tem certezas, que teimas em desculpar, eu sei, todos os motivos inventados perdem caducidade à claridade, todos os recuos até alguns amuos que levas por diante, perante a luz do sol desfazem-se como bola de neve, quando aquecida pelo sol tímido de Janeiro. Eu sei meu amor, tu responderias à tarde que tudo são retiros, tudo são rodeios sem significado, sei também que me vais achar inoportuna por conversar com a tarde. Pois é meu amor, o silêncio que me impões leva-me a procurar outras conversas, acho que amanhã estarei a escrever à tarde, enquanto tu te distancias numas voltas sem sentido.

1 comentário:

  1. Tudo em ti são palavras.

    Seja prosa ou poesia tu és mestre.

    Beijinhos e parabéns por mais este espaço.

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