Hoje, escrevo-te porque estou
naqueles dias em que as palavras se atropelam, para no final saírem aos carpidos.
Apetecia-me falar sobre o verde na Primavera, mas o resultado é cinzento,
igual aos dias de Inverno. Ainda há pouco a ventania entrou pela janela,
percorreu as divisões da casa, e voltou a sair. Deixando atrás de si, uma
saudade, e como volta e meia sou tolhida pela saudade do amanhã, o que confesso
é uma carga de trabalhos. Normalmente, temos saudades do que já passou, eu
tenho saudades de ter saudades de águas passadas, porque as saudades do amanhã
preenchem o meu imaginário.
As saudades do amanhã são mais traiçoeiras,
nunca sabemos se vão acontecer. Às vezes penso, não posso chamar saudade à
nostalgia, embora o bom senso me afirme que vai dar ao mesmo, mas, não é bem
assim, para mim não é e pronto. Caso encerrado, saudade e
nostalgia não é a mesma coisa. Já imaginação e devaneio, andam paredes meias.
Por isso a ventania que entrou
pela janela teve o condão de me insuflar a imaginação, nem queiras saber… Fiquei
numa roda-viva, ele foram cravos e rosas, andorinhas e margaridas, até uma
astuta raposa me infernizou a alma.
Passado algum tempo, entrou
pela janela o cheiro do montado, aí pensei, desta não escapas, é agora que sai
o poema, e saiu!
Dorido, completamente despido
e desalinhado, ponderei… Os poemas também podem ser desalinhados, revirei-o
dos pés à cabeça, e o coitado implorou que o enterrasse lá no alto, junto de
todos os versos inacabados. Fiz-lhe a vontade, não sem antes lhe lapidar a
pontas, que guardei no coração, para te mandar amanhã na volta do correio.
Mas como não há duas sem três,
entrou pela janela o barulho da água a correr, nem queria acreditar… Então não querem
lá ver: Aquele riacho ternurento, veio, e com ele as cegonhas sobrevoaram a
minha sala, nas asas, uma rima de amor, nas penas, atracadas as saudades, e no
bico, o que restaram dos beijos de ontem. Dizem que foi o dia do beijo, e hoje
parece que é o do café. Sempre quero ver como é que amanhã me envias uma xícara de café.
O melhor é acabar com a
conversa, ou fico aqui até de manhã. Termino com a saudade do que ainda há-de
acontecer…
Com um beijo antes de
adormecer!
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